Mário Quintana
De forma simples e serena MÁRIO QUINTANA consegue tocar meu coração...espero que consiga tocar o de vocês também...
“Tenta Esquecer-me”
Tenta esquecer-me… Ser lembrado é como evocar
Um fantasma… Deixa-me ser o que sou,
O que sempre fui, um rio que vai fluindo…
Em vão, em minhas margens cantarão as horas,
Me recamarei de estrelas como um manto real,
Me bordarei de nuvens e de asas,
Às vezes virão a mim as crianças banhar-se…
Um espelho não guarda as coisas refletidas!
E o meu destino é seguir… é seguir para o Mar,
As imagens perdendo no caminho…
Deixa-me fluir, passar, cantar…
Toda a tristeza dos rios
É não poder parar!
“Bilhete”
Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres, enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada.
Que a vida é breve, e o amor mais breve
ainda…
“Canção Para Uma Valsa Lenta”
Minha vida não foi um romance…
Nunca tive até hoje um segredo.
Se me amar, não digas, que morro
De surpresa… de encanto… de medo…
Minha vida não foi um romance
Minha vida passou por passar
Se não amas, não finjas, que vivo
Esperando um amor para amar.
Minha vida não foi um romance…
Pobre vida… passou sem enredo…
Glória a ti que me enches de vida
De surpresa, de encanto, de medo!
Minha vida não foi um romance…
Ai de mim… Já se ia acabar!
“O Velho Do Espelho”
Por acaso, surpreendo-me no espelho: quem é esse
Que me olha e é tão mais velho do que eu?
Porém, seu rosto…é cada vez menos estranho…
Meu Deus, Meu Deus…Parece
Meu velho pai – que já morreu!
Como pude ficarmos assim?
Nosso olhar – duro – interroga:
“O que fizeste de mim?!”
Eu, Pai?! Tu é que me invadiste,
Lentamente, ruga a ruga…Que importa? Eu sou, ainda,
Aquele mesmo menino teimoso de sempre
E os teus planos enfim lá se foram por terra.
Mas sei que vi, um dia – a longa, a inútil guerra!-
Vi sorrir, nesses cansados olhos, um orgulho triste…
“Os Parceiros”
Sonhar é acordar-se para dentro:
de súbito me vejo em pleno sonho
e no jogo em que todo me concentro
mais uma carta sobre a mesa ponho.
Mais outra! É o jogo atroz do Tudo ou Nada!
E quase que escurece a chama triste…
E, a cada parada uma pancada,
o coração, exausto, ainda insiste.
Insiste em quê?Ganhar o quê? De quem?
O meu parceiro…eu vejo que ele tem
um riso silencioso a desenhar-se
numa velha caveira carcomida.
Mas eu bem sei que a morte é seu disfarce…
Como também disfarce é a minha vida!
“Carta”
Eu queria trazer-te uma imagem qualquer
para os teus anos…
Oh! mas apenas este vazio doloroso
de uma sala de espera onde não está ninguém…
É que, longe de ti, de tuas mãos milagrosas
de onde os meus versos voavam – pássaros de luz
a que deste vida com o teu calor –
é que longe de ti eu me sinto perdido
– sabes? –
desertamente perdido de mim!
Em vão procuro…
mas só vejo de bom, mas só vejo de puro
este céu que eu avisto da minha janela.
E assim querida, eu te mando este céu, t
odo este céu de Porto Alegre
e aquela nuvenzinha
que está sonhando, agora em pleno azul!
“Eu Escrevi um Poema Triste”
Eu escrevi um poema triste
E belo, apenas da sua tristeza.
Não vem de ti essa tristeza
Mas das mudanças do Tempo,
Que ora nos traz esperanças
Ora nos dá incerteza…
Nem importa, ao velho Tempo,
Que sejas fiel ou infiel…
Eu fico, junto à correnteza,
Olhando as horas tão breves…
E das cartas que me escreves
Faço barcos de papel!
Mais
Quem ama inventa
Quem ama inventa as coisas a que ama…
Talvez chegaste quando eu te sonhava.
Então de súbito acendeu-se a chama!
Era a brasa dormida que acordava…
E era um revôo sobre a ruinaria,
No ar atônito bimbalhavam sinos,
Tangidos por uns anjos peregrinos
Cujo dom é fazer ressurreições…
Um ritmo divino? Oh! Simplesmente
O palpitar de nossos corações
Batendo juntos e festivamente,
Ou sozinhos, num ritmo tristonho…
Ó! meu pobre, meu grande amor distante,
Nem sabes tu o bem que faz à gente
Haver sonhado… e ter vivido o sonho!